Filme Ainda Estou Aqui (Foto:
Divulgação)
Por Emir Sader*
Vi, de novo, Ainda Estou Aqui. Gostei ainda mais do filme.
É uma boa reconstrução do que foi aquele tempo. Creio que, com sensibilidade suficiente e contando com a extraordinária atuação de Fernanda Torres, o filme consegue alcançar um público mais amplo, trazendo uma ideia do que foi aquele período terrível – que, como vimos pelos documentos recentemente revelados – tentaram fazer retornar.
Eu conheci a Eunice, em São Paulo, mas, para mim, ela era muito mais a mãe do Marcelinho – com quem tive a oportunidade de conviver em São Paulo – do que a protagonista daqueles dramas terríveis. Eu não tinha ideia de tudo o que ela passou e da barra que enfrentou. Os tormentos pelos quais ela passou, tentando, ao mesmo tempo em que mantinha a família, enfrentar a dolorosa experiência de buscar notícias de seu marido, enquanto recebia sempre a mesma resposta: "Desse caso, não temos informação."
O filme, provavelmente o melhor de Waltinho, já é uma obra definitiva sobre aquele período. Não que seja uma obra histórica ou que tenha pretendido reconstruir todo o contexto da época. Mas ele recolhe um caso particular, extremamente expressivo, para transmitir, a um público mais amplo, o clima instaurado pela ditadura militar.
Não importa se o filme, Fernanda ou Walter sejam recompensados com um ou vários Oscars. O filme, líder de público pela quarta semana de exibição nos cinemas – lotados – do Brasil, já é consagrado pela crítica e pelo público como um clássico do cinema brasileiro. E já está trilhando uma importante carreira em outros países.
É, sem dúvida alguma, um filme político, inserido no período da ditadura militar, sem o qual nada da história contada seria possível. Mas, ao mesmo tempo, pela sensibilidade da direção de Waltinho e pela interpretação de Fernanda e de todo o elenco, é uma película dramática, humana, que reproduz, com fidelidade, um caso concreto.
Podemos dizer que todos nós ainda estamos aqui. Seja porque muitos de nós, que vivemos aqueles tempos, mesmo feridos pelas perdas que tivemos, ainda estamos aqui. Seja porque os agentes daquele período, os militares, também ainda estão por aqui. E, como se afirma no final do filme, mesmo que os autores daquele crime tenham sido identificados, nenhum deles foi punido.
Então, ainda estamos todos aqui, de um lado e do outro. É um filme que fazia falta. Não apenas para recordar aquele caso e contá-lo como uma belíssima narrativa, mas para mostrar como a história brasileira de hoje é a continuidade daquela.
Vale muito a pena que todos assistam Ainda Estou Aqui. Para que todos sintam que, de alguma forma, todos ainda estamos aqui – seja pelo que vivemos naquele período ou pelo que vivemos hoje.
Obrigado,
Waltinho, Fernanda e todos os envolvidos. Só podemos agradecê-los, mantendo o
filme, ainda por várias semanas, na liderança de público. E falando,
discutindo, debatendo, expressando como tudo aquilo ainda está vivo em nós e
permanecerá para sempre.
*Emir Sader é escritor, articulista e um dos principais sociólogos e cientistas políticos brasileiros. Fonte: Brasil247
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