terça-feira, 5 de dezembro de 2023

RECUERDOS DE UMA JORNADA ÀS MISSÕES DO RS

 

          

Por Paulo Prestes* 

Há algo  místico  na terra de Sepé Tiarajú, Olívio Dutra, Jaime Caetano Braun, Pedro Ortaça e Noel Guarany, este nascido na Bossoroca, quando o município era distrito de São Luiz Gonzaga.  Certamente esse misticismo originou-se da epopeia que envolveu os reinos de Espanha, Portugal, os Jesuítas e os Guarani no passado, mas que foi mantido pela poesia e é preservado  por sua gente, ao longo dos tempos. 

Por isso, quando volto às missões, recarrego o espírito missioneiro e me sacio da cultura que jorra em cada canto das cidades, nas praças,  nas igrejas, nos monumentos aos poetas e guerreiros, no sotaque e nos costumes da sua gente. 

Desta vez,  fui acompanhado do meu compadre Antônio Prestes Braga, também um missioneiro de nascimento e atualmente morador de Santo Ângelo. O nosso roteiro iniciou por Rio Pardo e Cachoeira, cidades históricas, que tiveram as Reduções Jesuítico-Guarani de São Joaquim e Jesus Maria, José nas suas proximidades, ambas destruídas pelos bandeirantes paulistas, liderados por Antônio Raposo Tavares, homenageado com nome de rodovia em São Paulo. Aliás, a contradição histórica não passa despercebida. Como deixar de pensar que nosso país homenageia assassinos de índios e, ainda hoje, dificulta o reconhecimento dos direitos dos povos originários?

Em Rio Pardo, conhecemos a Escola Estadual Barro Vermelho, muitos educadores e o diretor Daniel Toscani, que nos recebeu com hospitalidade. Contou-nos o professor Daniel, que seu avô apresentou-se a Luís Carlos Prestes, quando o cavaleiro da esperança acampou em São Luiz Gonzaga, em outubro de 1924 e tornou-se o ferreiro do comandante, que naquele mesmo mês conduziu a Coluna Prestes em direção ao interior do Brasil. O velho Toscani pagaria um preço por isso, pois  mesmo que não tivesse acompanhado a Coluna, mais tarde seria preso sob acusação de comunista.

Já em Cachoeira, cidade em que o atual prefeito do PP está afastado, sob acusação de  corrupção, fomos recebidos pelo amigo  Nei Sena, um antigo lutador em defesa da Educação Pública, dirigente estadual do CPERS/Sindicato, com quem almoçamos e trocamos avaliações políticas.

Em seguida, fomos para Santa Maria,  cidade universitária, que já foi um centro ferroviário do RS. Lá vimos queridos familiares e, na sede do 2º Núcleo  do CPERS/Sindicato, dirigido pela companheira Dgenne, conhecemos companheiros da luta pela educação pública de qualidade, com quem trocamos experiências. 

Na Santiago de meus avós, de muitos tios, tias, primos, primas e de meu pai, fomos recebidos pelo Pedrinho Matos, sobrinho de João Corrêa, com quem partilhamos a mesa do domingo,  ao lado de Júlio Garcia, advogado, poeta, um dos fundadores do PT e da CUT, grande liderança política da cidade, seus familiares, dos professores Liamara e Rubem Finamor, do presidente do PT de Santiago,  Luís Rodrigues,  sua esposa e mais alguns companheiros.

Ao lado de Pedrinho e Júlio Garcia percorremos a imprensa local, com direito à participação na rádio Santiago e encerramos a passagem no 29º Núcleo do CPERS, dirigido pelo professor Leandro, que nos recepcionou com muita cordialidade. Matei a saudade da Santiago, de muitas e agradáveis memórias da infância e da adolescência, dos primos, primas e de breves amores juvenis.

Na sequência da viagem, chegamos à Bossoroca, onde visitamos o lindo monumento construído em homenagem a Noel Guarany. A lamentar, o estado da estação ferroviária da cidade, que está em precárias condições, ao contrário da estação de Santiago, hoje um bonito centro cultural. 

Em São Luiz Gonzaga, como não poderia deixar de ser, muitas emoções. Já na entrada da cidade, nos encontramos com Jorginho/Leãozinho, companheiro de muitas lutas em defesa de uma sociedade mais justa. Mais tarde, o encontro com queridos familiares, com os quais confraternizamos no “Boteco do Jorginho”. Apresentamos os livros na sede do 33º Núcleo do CPERS/Sindicato, dirigido pelo Professor Joner, que junto à amiga Eni Malgarin, companheiras e companheiros da cidade, nos trataram como celebridades. Encerramos o roteiro na cidade, visitando o campus da UERGS, onde falamos aos estudantes de Pedagogia, a Fundação Olívio Dutra e  o histórico Flávio Bettanin, um dos pioneiros da formação do PT em São Luiz Gonzaga. 

O roteiro encerrou-se em Santo Ângelo, a capital das Missões, onde falamos aos estudantes e professores do Instituto Federal de Educação, apresentamos os livros na sede do 9º Núcleo do CPERS/Sindicato e participamos de uma Audiência Pública em defesa de um curso de medicina público na cidade, liderada pelo companheiro Gilberto Corazza. Que baita audiência, se lá estivesse, o Pedro Ortaça certamente diria: “Os tempos hoje são outros”

O ilustre escritor Gabriel Garcia Marques deixou escrito no título de um dos seus livros: “Viver para contar” e o admirado Umberto Eco deu o recado: “Sobreviver é contar histórias”. Os dois me inspiram, mas não conto histórias apenas por eles, me submeto a esse ofício  sem reclamar, pois cada um tem ou deve ter o seu e sou grato  pelo que me coube.

*Paulo Prestes é professor, escritor e historiador.

**Na foto acima, em Santiago/RS, durante o lançamento do livro que conta a história do santiaguense João Corrêa (pracinha da  FEB, herói da Segunda Guerra Mundial), escrito por Paulo Prestes e  Sônia Corrêa (créditos da foto de Rosani Tusi de Mattos Garcia), aparecem: Antônio Prestes, Liamara  Finamor, Júlio Garcia, Paulo Prestes e Pedro Matos. 

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