Por Paulo Prestes*
Há algo místico na terra de Sepé Tiarajú, Olívio Dutra, Jaime Caetano Braun, Pedro Ortaça e Noel Guarany, este nascido na Bossoroca, quando o município era distrito de São Luiz Gonzaga. Certamente esse misticismo originou-se da epopeia que envolveu os reinos de Espanha, Portugal, os Jesuítas e os Guarani no passado, mas que foi mantido pela poesia e é preservado por sua gente, ao longo dos tempos.
Por isso, quando volto às missões, recarrego o espírito missioneiro e me sacio da cultura que jorra em cada canto das cidades, nas praças, nas igrejas, nos monumentos aos poetas e guerreiros, no sotaque e nos costumes da sua gente.
Desta vez, fui acompanhado do meu compadre Antônio
Prestes Braga, também um missioneiro de nascimento e atualmente morador de
Santo Ângelo. O nosso roteiro iniciou por Rio Pardo e Cachoeira, cidades
históricas, que tiveram as Reduções Jesuítico-Guarani de São Joaquim e Jesus
Maria, José nas suas proximidades, ambas destruídas pelos bandeirantes
paulistas, liderados por Antônio Raposo Tavares, homenageado com nome de
rodovia em São Paulo. Aliás, a contradição histórica não passa despercebida.
Como deixar de pensar que nosso país homenageia assassinos de índios e, ainda
hoje, dificulta o reconhecimento dos direitos dos povos originários?
Em Rio Pardo, conhecemos a Escola
Estadual Barro Vermelho, muitos educadores e o diretor Daniel Toscani, que nos
recebeu com hospitalidade. Contou-nos o professor Daniel, que seu avô
apresentou-se a Luís Carlos Prestes, quando o cavaleiro da esperança acampou em
São Luiz Gonzaga, em outubro de 1924 e tornou-se o ferreiro do comandante, que
naquele mesmo mês conduziu a Coluna Prestes em direção ao interior do Brasil. O
velho Toscani pagaria um preço por isso, pois
mesmo que não tivesse acompanhado a Coluna, mais tarde seria preso sob
acusação de comunista.
Já em Cachoeira, cidade em que o atual
prefeito do PP está afastado, sob acusação de
corrupção, fomos recebidos pelo amigo
Nei Sena, um antigo lutador em defesa da Educação Pública, dirigente
estadual do CPERS/Sindicato, com quem almoçamos e trocamos avaliações
políticas.
Em seguida, fomos para Santa Maria, cidade universitária, que já foi um centro
ferroviário do RS. Lá vimos queridos familiares e, na sede do 2º Núcleo do CPERS/Sindicato, dirigido pela companheira
Dgenne, conhecemos companheiros da luta pela educação pública de qualidade, com
quem trocamos experiências.
Na Santiago de meus avós, de muitos tios,
tias, primos, primas e de meu pai, fomos recebidos pelo Pedrinho Matos,
sobrinho de João Corrêa, com quem partilhamos a mesa do domingo, ao lado de Júlio Garcia, advogado, poeta, um
dos fundadores do PT e da CUT, grande liderança política da cidade, seus
familiares, dos professores Liamara e Rubem Finamor, do presidente do PT de
Santiago, Luís Rodrigues, sua esposa e mais alguns companheiros.
Ao lado de Pedrinho e Júlio
Garcia percorremos a imprensa local, com direito à participação na rádio
Santiago e encerramos a passagem no 29º Núcleo do CPERS, dirigido pelo
professor Leandro, que nos recepcionou com muita cordialidade. Matei a saudade
da Santiago, de muitas e agradáveis memórias da infância e da adolescência, dos
primos, primas e de breves amores juvenis.
Na sequência da viagem, chegamos à Bossoroca, onde visitamos o lindo monumento construído em homenagem a Noel Guarany. A lamentar, o estado da estação ferroviária da cidade, que está em precárias condições, ao contrário da estação de Santiago, hoje um bonito centro cultural.
Em São Luiz Gonzaga, como não poderia deixar de ser, muitas emoções. Já na entrada da cidade, nos encontramos com Jorginho/Leãozinho, companheiro de muitas lutas em defesa de uma sociedade mais justa. Mais tarde, o encontro com queridos familiares, com os quais confraternizamos no “Boteco do Jorginho”. Apresentamos os livros na sede do 33º Núcleo do CPERS/Sindicato, dirigido pelo Professor Joner, que junto à amiga Eni Malgarin, companheiras e companheiros da cidade, nos trataram como celebridades. Encerramos o roteiro na cidade, visitando o campus da UERGS, onde falamos aos estudantes de Pedagogia, a Fundação Olívio Dutra e o histórico Flávio Bettanin, um dos pioneiros da formação do PT em São Luiz Gonzaga.
O roteiro encerrou-se em Santo Ângelo, a
capital das Missões, onde falamos aos estudantes e professores do Instituto
Federal de Educação, apresentamos os livros na sede do 9º Núcleo do
CPERS/Sindicato e participamos de uma Audiência Pública em defesa de um curso
de medicina público na cidade, liderada pelo companheiro Gilberto Corazza. Que
baita audiência, se lá estivesse, o Pedro Ortaça certamente diria: “Os tempos
hoje são outros”
O ilustre escritor Gabriel Garcia
Marques deixou escrito no título de um dos seus livros: “Viver para contar” e o
admirado Umberto Eco deu o recado: “Sobreviver é contar histórias”. Os dois me
inspiram, mas não conto histórias apenas por eles, me submeto a esse
ofício sem reclamar, pois cada um tem ou
deve ter o seu e sou grato pelo que me
coube.
*Paulo Prestes é professor,
escritor e historiador.
**Na foto acima, em Santiago/RS, durante o lançamento do livro que conta a história do santiaguense João Corrêa (pracinha da FEB, herói da Segunda Guerra Mundial), escrito por Paulo Prestes e Sônia Corrêa (créditos da foto de Rosani Tusi de Mattos Garcia), aparecem: Antônio Prestes, Liamara Finamor, Júlio Garcia, Paulo Prestes e Pedro Matos.
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