*Por
Igor Felippe/ @igorfelippes
Roberto
Amaral gosta quando é chamado de cientista social e autor do livro “Socialismo:
vida. morte ressurreição”, em parceria com Antônio Hoauiss. No entanto, sua
carreira vai para além do muro das universidades.
Um dos
quadros mais preparados e comprometidos do velho PSB, foi ministro da Ciência e
Tecnologia no governo Lula. Com a morte do líder do partido, Eduardo Campos, no
meio da disputa presidencial em 2014, virou presidente do PSB e renunciou
quando o partido aderiu à candidatura de Aécio Neves, no segundo turno da
disputa.
Amaral
está acompanhando a conjuntura política e tem produzido muitos artigos,
publicados em seu blog na internet. Nesta entrevista exclusiva, ele apresenta
sua análise da crise que o país atravessa. Leia abaixo.
Impasse
institucional
Para
além da crise do governo Dilma, caminha-se para um impasse institucional
açulado pelo avanço político e eleitoral de forças assumidamente de direita,
aliadas a setores irresponsáveis do capitalismo moderno, usando e sendo usados
pelo que há de mais atrasado na política brasileira: o fisiologismo, o
fundamentalismo religioso, a corrupção, o sentimento antipopular, antinacional.
Esse ajuntamento está sendo coordenado política e ideologicamente pela grande
imprensa brasileira, que desempenha, hoje, entre nós, o mesmo papel
desestabilizador — da economia, da política e do governo — levado a cabo em
1954 e nos idos de 1963/64, com as consequência sabidas para o povo brasileiro.
Desestabilização
A
rigor, a última eleição presidencial só se encerrou em 2014 do ponto de vista
jurídico. Politicamente, ela prossegue, sem intervalo, sem descanso. No Brasil
inauguramos o ´terceiro turno`, com o objetivo claro e assumido de
desestabilizar o governo recém-eleito, o que equivale a tentativa de invalidar
o pronunciamento eleitoral. Esse processo antidemocrático e antirepublicano
observa etapas cuidadosamente planejadas: primeiro, fase vencida, a tentativa
de deslegitimar o mandato com o especioso pedido de recontagem dos votos, a
seguir a tentativa de impedimento (fase atual). Se desta não se saírem
vitoriosas, as forças da reação intentarão impedir o governo Dilma. Ela fica,
jungida.
Fragilizar
a economia nacional
A
terceira fase é a desconstituição da Petrobrás (a destruição da empresa
nacional ligada à indústria do petróleo, a revisão do sistema de partilha para
entregar o pré-sal às companhias estrangeiras), a desestabilização do BRICS, a
destruição do MERCOSUL e a retomada da Alca e, ao fim e ao cabo, o retorno da subserviência
na política internacional. Houve, sim, muita bandalheira na Petrobrás, derivada
do concluiu entre empresários e executivos desonestos. No entanto, fica claro
que a campanha de imprensa é uma cortina de fumaça do grande objetivo:
desconstituir a empresa e fragilizar a economia nacional. O desnudamento está
explícito no jornal Valor de 27 de fevereiro passado. Diz-se ali: segundo
cálculos do Bank of America Merrill Liynch (BofA), a Petrobras “precisa vender
US$ 20 bilhões em ativos” e cortar substancialmente seus investimentos em pelo
menos US$ 25 bilhões”.
Sangrar
ou derrubar o governo?
A
direita trabalha com as duas hipóteses, e começa pelo mais barato: a sangria
sob controle na sequência que enunciei na resposta anterior. Do meu ponto de
vista, o golpe já foi dado, e seu dia inaugural foi a eleição do sr. Eduardo
Cunha para a presidência da Câmara dos Deputados, representando as forças
nacionais do atraso e as forças internacionais que não admitem a hipótese de
nosso desenvolvimento soberano (principalmente ajudando a América do Sul a
seguir o mesmo caminho de independência e defesa prioritária de seus interesses
nacionais e dos interesses de seus povos).
Ofensiva
continental
A ação
desestabilizadora começou na Venezuela, foi repelida no Equador e na Bolívia,
se instalou na Argentina e agora está em curso em nossa casa. Desse projeto,
Eduardo Cunha é servidor habilitado, competente e já anunciou ao que veio: nada
de progresso legislativo e sim revisão dos avanços. Nada de reforma politica democrática,
mas sim abertura para a ação corruptora do capital privado, do empresariado
rentista e financeiro, cujos interesses ele muito bem representa. Não sem
razão, no vestibular de sua campanha para a presidência da Câmara, o deputado
Cunha se apressou em estabelecer acordo com o sistema Globo, anunciado publicamente
pelo grande jornal, de impedir a tramitação de qualquer iniciativa que vise ao
controle social das empresas de comunicação eletrônica, na contra-mão do que
determina a Constituição.
Aliança
do poder
A
República, hoje, é governada por uma aliança informal constituída pelos meios
de comunicação de massa liderado pelo sistema Globo, por uma Câmara dos
Deputados conservadora e chantagista, por um Ministério Público e uma Polícia
Federal e segmentos do Judiciário que exorbitam de suas competências. O
autoritarismo da ‘República de Curitiba’ é bem representados no Rio de Janeiro
por esse Flávio Roberto de Souza, ainda juiz da 3ª vara federal criminal do Rio
de Janeiro que se permite usufruir os bens de luxo apreendidos judicialmente
por ele mesmo. Hoje, qualquer juiz, mesmo qualquer ministro do STF, antes de
prolatar uma sentença ou relatar um processo, ou votar num colegiado, consulta,
não mais os autos, não mais sua formação jurídica, não mais sua consciência;
ele se pergunta como seu julgamento será recebido pela grande imprensa.
Enfraquecimento
do governo
Deve-se
não necessariamente nessa ordem: aos erros coletivos do PT e aos erros
individuais de importantes lideranças suas; à natural fadiga de material após
12 anos de governo; à crise internacional; à crise econômica nacional; à crise
hídrica (da qual pode resultar a crise de fornecimento de energia) e, na base
de tudo, à coalizão partidária, uma verdadeira mixórdia, montada para dar
sustentação (que sustentação?) ao governo a partir de negociações pouco
republicanas. [Ou, como diria Chico Buarque, "tenebrosas
transações"...]
Dispersão
no Congresso
Por
ausência de estratégia de governo, por ausência de uma estratégia política dela
resultante e dela servidora. Pelas políticas pontuais, priorizando iniciativas
táticas fora de um conjunto planejado de ação. Mas também pelo autismo do PT,
por uma certa ausência de humildade e pela incapacidade de fazer autocrítica.
Protestos
da direita
A
ocupação das ruas pela direita é o outro lado da ausência das forças de
esquerda e progressistas. Onde elas estão? Onde estão nossas lideranças
sindicais e estudantis? Onde estão os partidos que controlam os gabinetes da
Esplanada dos Ministérios? É necessário ocupar os espaços que a esquerda está
deixando vazios, fazer o discurso que a nação aguarda, já inquieta.
Fonte: http://www.revistaforum.com.br/
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