Por Ricardo Kotscho*
É como se Aécio Neves
dissesse para Dilma Rousseff, ao final desta opera bufa em que encarna Carlos
Lacerda à beira de um ataque de nervos: "Tudo bem, eu perdi a eleição, não
vou ser mais presidente, mas você também não vai governar. Nós não deixaremos".
Vai ficando mais claro a
cada dia que o objetivo real da oposição é um só: criar o clima e as condições
necessárias para que a presidente reeleita Dilma Rousseff não assuma o segundo
mandato e, se isso acontecer, impedi-la de governar o país pelos próximos
quatro anos.
A guerra deflagrada contra a
votação do projeto de lei para autorizar mudanças na meta fiscal de 2014, que
terminou nesta madrugada de quinta-feira, com mais uma vitória do governo, foi
apenas o pretexto imediato utilizado pelas oposições mobilizadas no Congresso
Nacional, no Judiciário e na mídia para uma ofensiva golpista sem precedentes.
* No Congresso Nacional _ O
vale tudo começou na noite de terça-feira, quando uma tropa de choque
oposicionista invadiu as galerias e tentou impedir a votação no grito e na
marra. Eram apenas uns 30 bate-paus ensandecidos, gritando as mesmas palavras
de ordem utilizadas nas recentes manifestações da avenida Paulista, em São
Paulo, enquanto parlamentares do PSDB e do DEM, entre outros menos votados,
ocupavam a tribuna com ataques irados contra Dilma e o PT, mas foi o suficiente
para que, diante da baderna promovida pelos arruaceiros, o presidente do
Senado, Renan Calheiros, suspendesse a sessão.
"Esta é a casa do povo
e o PT tem que aprender a conviver com o povo novamente nas galerias",
defendeu Aécio, que há muito tempo não usava a palavra povo duas vezes na mesma
frase. Eles voltaram mais enfurecidos na manhã de ontem, dispostos a impedir a
entrada de deputados e senadores, agora acoitados por tipos como Ronaldo
Caiado, revivendo seus tempos de líder da famigerada UDR, e Paulinho da Força,
sempre o mesmo, entre outros baluartes da democracia, que dão sustentação à
"nova oposição" liderada por Aécio Neves. Nem o ex-presidente da
República José Sarney escapou do cerco, que o deixou bastante assustado, quando
os manifestantes chutaram e tentaram virar o seu carro.
À tarde, os representantes
do povo pró-Aécio, convocados pela rede social por entidades como
"Movimento Brasil Livre e Democracia", "Revoltados Online"
e "O Brasil despertou", que passaram o dia gritando "Fora PT",
"PT roubou" e "Vá para Cuba", receberiam o reforço do
indescritível cantor Lobão, que apareceu em Brasília para liderar um
"movimento popular" contra a votação, e chegou a ir ao STF para pedir
a liberação do acesso às galerias.
Em conversas reservadas com
sua tropa, segundo a Folha de S. Paulo, o ex-governador mineiro já deu as
instruções, para não deixar dúvidas: a ordem é "cumprir o objetivo de
deixar o governo Dilma no chão". Caso o projeto de lei sobre flexibilização
da meta fiscal não fosse aprovado, a estratégia tucana era denunciar Dilma por
"crime de responsabilidade", para embasar um pedido de impeachment.
Derrotados novamente, agora os aliados de Aécio jogam todas suas fichas nas
denúncias dos delatores na Operação Lava-Jato, uma ação casada com vazamentos
seletivos, para levar o "mar de lama" até o gabinete presidencial.
"Se comprovadas essas
denúncias, estamos diante de um governo ilegítimo", disparou Aécio Neves,
nosso Carlos Lacerda redivivo, agora em nova versão radical chique, em que
chegou a perder o fôlego ao final de mais um discurso incendiário para impedir
a votação da lei, depois de ter afirmado em entrevista que perdeu a eleição
para uma "organização criminosa".
É em meio a este clima
beligerante que a Câmara Federal se prepara para eleger o ínclito Eduardo Cunha
(PMDB-RJ) como seu novo presidente, em fevereiro. E é com a boa vontade dele
que a oposição conta caso consiga formalizar o sonhado pedido de impeachment,
para abreviar sua volta ao poder. É o presidente da Câmara, afinal, quem decide
se o pedido será ou não acolhido para seguir adiante nas comissões e no
plenário. Assim se fecharia o cerco programado.
* No Judiciário _ Enquanto
juízes e delegados da Operação Lava-Jato, em Curitiba, vão soltando a cada dia
novas denúncias de pagamentos de propinas por executivos de empreiteiras a
emissários do PT e partidos aliados, em Brasília arma-se o ataque final para
colocar na mira diretamente a presidente Dilma Rousseff e, se possível, também
seu antecessor Lula, virtual candidato a voltar em 2018. Segundo o jornal O
Globo, o ministro Gilmar Mendes, sempre ele, do STF, já está preparando uma
"devassa" nas contas da campanha da reeleição.
A estratégia ganhou força
com o depoimento do empresário Augusto Ribeiro de Mendonça Neto em que ele
afirmou ter feito pagamentos de propina em troca de contratos na Petrobras, na
forma de "doações oficiais ao Partido dos Trabalhadores", que teriam
começado em 2010, quando Lula era o presidente e Dilma candidata à sua
sucessão.
O alvo imediato é João
Vaccari Neto, tesoureiro do PT nas campanhas de 2010 e 1014, citado nas
delações feitas pelo doleiro Alberto Youssef e pelo ex-diretor da Petrobras
Paulo Roberto Costa. Com base nos vazamentos destas delações premiadas, lideres
da oposição revezam-se nas tribunas da Câmara e do Senado, quase sem
contestação dos aliados do governo, para denunciar que está "sob
suspeita" o comando do país.
* Na mídia _ Para amarrar as
pontas e fechar a roda, não poderia faltar o decisivo apoio da mídia
tucano-familiar, que rasgou a fantasia, e há semanas dedica a maior parte dos
seus noticiários à Operação Lava-Jato, como se nada mais estivesse acontecendo
no país, colocado à beira do abismo.
Já não se sabe se é a mídia
que pauta as oposições no Congresso e no Judiciário ou vice-versa, pois virou
tudo uma coisa só, muito bem orquestrada, por sinal. As manchetes e os
destaques dos veículos impressos ou eletrônicos parecem ser produzidos pela
mesma pessoa, a partir de um comando central que atende pelo pomposo nome de
Instituto Millenium.
Após uma brevíssima trégua,
com a indicação de Joaquim Levy para comandar a economia no segundo mandato,
parece que resolveram abrir todas as comportas para inundar o país com o
"mar de lama", uma criação original de Carlos Lacerda contra Getúlio
Vargas, agora ressuscitada por Aécio Neves, que parece ter trocado
definitivamente o PSD conciliador do seu avô Tancredo Neves pela velha UDN
golpista das vivandeiras de porta de quartel.
Neste cenário de vale tudo,
de nada adianta a presidente Dilma tentar acalmar as feras fazendo seguidas
concessões à direita derrotada nas urnas. Ela e Lula são e serão tratados como
inimigos a serem abatidos, sem dó nem piedade. Após 12 anos de PT no poder
central, a turbulência brava está só começando. Senhores passageiros, fechem as
mesinhas à sua frente, amarrem os cintos e desliguem seus aparelhos
eletrônicos.
Vida que segue. E seja o que
Deus quiser.
*Jornalista - Via Balaio do Kotscho in http://noticias.r7.com/
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