Por
Maria Inês Nassif, na Carta Maior*
A crise econômica vivida pelo governo
Dilma Rousseff, no primeiro ano de seu segundo mandato, nem de longe tem a
gravidade da que balançou o país no primeiro ano do segundo mandato de Fernando
Henrique Cardoso (1999-2002). A crise política enfrentada por Dilma apenas é
mais intensa que a de FHC nesse primeiro ano de segundo mandato porque ele
tinha uma base de apoio que, embora mais vulnerável do que a dos primeiros
quatro anos, reunia elementos de coesão ideológica inexistentes na atual
coalizão governista. FHC apenas tinha uma posição um pouco mais confortável do
que tem Dilma agora.
No
governo FHC, a aliança parlamentar se fazia do centro à direita ideológica.
Assim, mesmo que houvessem discordâncias pessoais na base parlamentar e
quedas-de-braço do Congresso com o Palácio do Planalto – e o então senador
Antonio Carlos Magalhães (PFL-BA) fazia questão que isso acontecesse com
regularidade –, nas questões fundamentais para o projeto econômico os
interesses convergiam. Ajudava a constituir maiorias parlamentares o apoio dos
meios de comunicação às chamadas “reformas estruturais” – e a pressão de fora
para dentro do Congresso tinha o poder de resolver as disputas mais mesquinhas.
Nas
gestões do PT, a diluição ideológica do apoio parlamentar – ao centro, à
direita e à esquerda – tornaram a vida dos presidentes Lula e Dilma mais
difícil. No governo Dilma, a exposição de uma fragilidade econômica deu à mídia
oposicionista o elemento que faltava para pressionar os parlamentares, de fora
para dentro do Congresso, a assumirem posições contrárias ao governo; e, junto
à opinião pública, jogar elementos de insegurança e desqualificar toda a gestão
anterior.
Ainda
assim, e apesar da propaganda contrária ao governo Dilma, não se pode atribuir
ao ex-presidente Fernando Henrique Cardoso qualidades morais para pontificar
julgamentos sobre política econômica, ajuste fiscal, relacionamento com a base
parlamentar, relações apropriadas com financiadores de campanha ou de
fidelidade a promessas eleitorais da atual presidente. Se sua experiência
ajudar em alguma coisa a crise de agora, é para dar o exemplo de como não fazer
o ajuste fiscal, de como não se relacionar com a base parlamentar e de como não
fazer política eleitoral.
No
ano de 1999, segundo os jornais, o Brasil pagava a conta do governo anterior
tucano, que manteve a estabilidade de preços às custas de uma âncora cambial
artificial e de uma política fiscal rigorosa, que resultou numa enorme
fragilidade externa, em grande desemprego, pífio crescimento econômico e,
ironicamente, aumento da inflação.
A
conta foi alta. Em 1998, o Produto Interno Bruto (PIB) cresceu 0,4%, e em 1999,
0,5%; o dólar, que valia R$ 1,2 em 1998, saltou para R$ 1,8 no ano seguinte. A
inflação foi de 8,9% em 1999; o ajuste fiscal do governo imprimiu uma inflação
de 19,2% em 1999 sobre os preços monitorados (petróleo e energia). O consumo
das famílias teve crescimento negativo de 0,7% em 1998 e apenas 0,4% positivo
no ano seguinte. O investimento público federal caiu de 2,1% do PIB em 1998
para 1,4% em 1999; a taxa de investimento, de 17% para 15,7% do PIB; a formação
bruta de capital fixo, que sofreu variação negativa de 0,2% em 1998, chegou ao
fundo do poço em 1999, com queda de 8,9% em relação ao ano anterior.
As
reservas internacionais, que eram de US$ 52,1 bilhões em 1997 e haviam caído
para US$ 34,4 bilhões em 1998, chegaram ao perigoso nível de US$ 23,9 bilhões
em 1999. O saldo da balança comercial no final do ano eleitoral de 1998 foi
negativo em US$ 6,6 bilhões, e em 1999 de US$ 1,3 bilhões. Em 1998, o Brasil
perdeu 36 mil postos de trabalho, e 582 mil em 1989.
Eleições
caras
Em
outubro de 1998, Fernando Henrique Cardoso conquistou o seu segundo mandato no
primeiro turno, com a ajuda de financiadores privados de campanha que haviam
sido enormemente beneficiados no seu primeiro governo e no governo Itamar
Franco, quando o PSDB ocupou o comando econômico que permitiu ao partido e a
FHC se credenciarem como os pais do Plano Real nas eleições de 1994.
Segundo
a Folha de S. Paulo (“Bancos lideram doações para campanha de FHC”, 26/11/1998
e “Bancos lideraram contribuições a FHC”, 6/6/1999), bancos e instituições
financeiras foram os principais doadores de campanha, e contribuíram com 25,7%
do total de R$ 43 milhões arrecadados pelo comitê do presidente reeleito.
É
o próprio jornal que lembra a razão do interesse de financiadores de campanha
do mercado financeiro pelo candidato: “Em novembro de 95, o governo FHC criou o
Proer, o programa de socorro a bancos em dificuldade. Já foram injetados R$ 21
bilhões para financiar fusões bancárias”, diz na material de 1998.
Na
matéria publicada em 1999, o jornal afirma: “No primeiro mandato de FHC, as
instituições [financeiras] viveram anos de prosperidade, segundo balanços
divulgados pelo Banco Central, e escaparam dos impostos, segundo a Receita
Federal. A soma do patrimônio líquido do conjunto das 223 instituições
financeiras mais do que duplicou no periodo, passando de R$ 26,426 bilhões para
R$ 55,653 bilhões”.
Além
disso, FHC teve uma generosa contribuição de empresas com interesse direto no
processo de privatização levado a termo pelo PSDB desde o governo Itamar.
Figuravam entre os dez maiores financiadores da campanha de 1998 de FHC a
Inepar (que participou do Consórcio Telemar), a Vale do Rio Doce (privatizada
em 1997), a Companha Siderúrgica Nacional (CSN, privatizada em 1993, quando FHC
era ministro de Itamar), a Copesul (privatizada em 1992) e a Copene
(privatizada em 1993). A Andrade e Gutierrez, que também fez parte do Consórcio
Telemar, figurava no 11o. lugar entre os financiadores de campanha do tucano.
*Fonte:
http://cartamaior.com.br/
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