Ao comemorar a decisão do Supremo Tribunal Federal que rejeitou a sua inclusão como réu no processo da Operação Rodin, o deputado federal José Otávio Germano (PP) disparou contra o ex-superintendente da Polícia Federal no Rio Grande do Sul, Ildo Gasparetto, contra procuradores do Ministério Público Federal no RS e contra a juíza Simone Barbisan Fortes. O parlamentar alegou ter sido vítima de uma ação orquestrada por esses agentes públicos. Germano não foi propriamente “absolvido” pelo STF, porque sequer foi submetido a julgamento. A decisão consistiu em desqualificar o modo de obtenção de provas que acabaram baseando a ação do MP Federal contra o deputado. O STF não descartou, porém, a abertura de uma nova investigação.
Diante da ameaça que paira sobre todo o processo da Operação Rodin, que apontou o desvio de cerca de R$ 44 milhões dos cofres públicos do Estado do Rio Grande do Sul, cabe recordar o teor das acusações e analisar o teor da argumentação que acabou sendo acolhida pelo STF. Mesmo tendo votado contra a denúncia do deputado gaúcho, o relator do processo, ministro Ricardo Lewandowski, ressaltou que nada impede que “a Procuradoria-Geral da República reinicie investigações sobre o caso, porém sob o comando do STF”.
Como se sabe, o STF rejeitou, quinta-feira (2), por maioria de votos, a denúncia do Ministério Público Federal contra José Otávio Germano (PP) pela suposta prática dos crimes de formação de quadrilha, peculato e dispensa ilegal de licitação, na época em que foi secretário de Segurança Pública do Rio Grande do Sul.
A maioria dos juízes do Supremo entendeu que “houve usurpação da competência exclusiva da Suprema Corte para processar, desde a fase instrutória, denúncias contra o deputado federal, em razão do foro por prerrogativa de função que detêm os parlamentares federais”. Na avaliação majoritária dos magistrados, a 3ª Vara Federal de Santa Maria, que autorizou investigações, “deveria ter declinado de sua competência, em favor da Suprema Corte, para processar e julgar o parlamentar, tão logo teve ciência do seu suposto envolvimento no caso sob investigação”.
Único voto discordante no caso, o ministro Luiz Fux entendeu que havia suficientes indícios de autoria e materialidade para o STF aceitar a denúncia e processar o deputado. Além disso, considerou que “as provas contra o parlamentar apareceram posteriormente à abertura do processo contra os demais indiciados na ação penal em curso no primeiro grau que, em função disso, declinou de sua competência para julgá-lo”, conforme nota publicada no site do STF.
No julgamento, prevaleceu, porém, o voto do relator Ricardo Lewandowski, segundo o qual a denúncia do MP Federal contra Germano “se baseou unicamente em dados de investigação realizada sem autorização da Suprema Corte”. Essas investigações incluíram quebra de sigilos telefônico e fiscal autorizados pela 3ª Vara da Justiça Federal em Santa Maria, onde tramita ação penal contra 44 pessoas acusadas de envolvimento em fraudes contra o Detran no RS.
Relembrando o caso
No dia 5 de agosto de 2009, o Ministério Público Federal protocolou, junto à Justiça Federal, no Rio Grande do Sul, uma ação civil de improbidade administrativa (um documento de mais de 1.200 páginas) contra a governadora Yeda Crusius (PSDB), o ex-marido desta (Carlos Crusius) e mais sete pessoas, entre elas, um deputado federal, dois estaduais e o então presidente Tribunal de Contas do Estado do RS. As acusações: enriquecimento ilícito, dano ao erário e infração de princípios administrativos, crimes relacionados à fraude que desviou cerca de R$ 44 milhões do Detran gaúcho. O MP Federal pediu, entre outras coisas, o afastamento da governadora e o bloqueio de bens da mesma, pedidos que foram negados pela Justiça.
A Operação Rodin teve relação com uma outra operação realizada na época, a Solidária. Em uma entrevista coletiva concedida no dia do anúncio da ação, o promotor Adriano dos Santos Raldi, afirmou: “Eu queria destacar que uma grande parte do que está sendo apresentado hoje é composto de elementos que foram recolhidos na Operação Solidária, que se iniciou em Canoas e que quando chegou ao Supremo Tribunal Federal sofreu um lamentável vazamento de informação que prejudicou a investigação. A Solidária poderia ser mais proveitosa se isso não tivesse ocorrido. Mas todos os elementos de interesse para este processo foram utilizados”.
A denúncia do MPF foi duríssima e apontou a existência de uma “quadrilha criminosa”, que teria lesado os cofres públicos:
“Os demandados agiram de forma imoral, pessoal, desleal, desonesta e ímproba, valendo-se da condição de ou em conjunto com agentes políticos e servidores públicos para obterem vantagens pessoais, utilizando-se dos respectivos cargos, de bens públicos e verbas públicas afetadas ao desenvolvimento de serviços públicos em área sujeita às suas atribuições funcionais e políticas.”
Esse grupo, prosseguiu a denúncia do MPF, constituiu “verdadeira quadrilha criminosa, que lesou os cofres públicos entre os anos de 2003, por volta do mês de junho, até o mês de novembro de ano de 2007 (deflagração da fase ostensiva da investigação).” A ação definiu assim a atuação desse grupo:
“A societas delinquentium restou formada pela associação perene e estável de diversas pessoas, integrantes de diferentes núcleos estatais e diversas esferas privadas, no objetivo consciente e deliberado de perpetrar, continuadamente, sob diversas formas e com a máxima lucratividade possível, as condutas ímprobas apuradas em face da Administração Pública e do Erário. O agir do grupo enquadra-se no conceito de organização criminosa da Lei n° 9.034/1995, estando presente a hierarquia da associação delitiva, o intuito lucrativo, gestão empresarial das negociatas criminosas, destruição de probas, omissão de rendimentos, corrupção do tecido social, inserção estatal ilegítima e blindagem patrimonial”.
“A organização criminosa era fortemente estruturada e sua atuação primordial voltava-se à obtenção e celebração de contratos públicos, mediante dispensa irregular de licitação em prol de fundações de apoio vinculadas à Universidade Federal de Santa Maria. (…) A quadrilha estabeleceu verdadeiro bureau do crime, utilizando-se, de forma fraudulenta, da possibilidade de dispensa de licitação para contratação de fundações de apoio, bem como de prestígios políticos de seus integrantes para o estabelecimento e manutenção dos intensos contatos com gestores públicos – para quem ‘vendiam’ a fraude e dos quais dependiam decisivamente para a consecução da sangria do Erário”.
Diante da gravidade da denúncia, da decisão do STF e das acusações feitas por José Otávio Germano aos agentes públicos que participaram dessa investigação, aguarda-se manifestação dos mesmos sobre a retomada ou não das investigações e sobre o futuro da ação como um todo.
*Por Marco Weissheimer, via sítio Su21 http://www.sul21.com.br
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