domingo, 9 de outubro de 2016

Opção preferencial pelo nada



Por Marcelo Carneiro da Cunha, no Sul21*
Estimados sulvinteumenses, voltei. Andei por aí, me atirei no goró, perdi a tramontana e a graça. Golpe, caros leitores, é pra acabar com a pessoa.
O Brasil de antes era uma coisa tão melhor. Lembram de um governo civilizado e civilizante, mesmo que a presidente tivesse lá os seus momentos medievais com os que trabalhavam por perto? Lembram de um Brasil que deu duro pra colocar outros personagens na universidade pública, ao ponto de eles hoje serem maioria onde antes só havia branquela da elite? Lembram de um Brasil republicano, onde as instituições estavam sendo fortalecidas, e não dizimadas por uma oligarquia que apenas aguardava o momento de voltar a barbarizar?
Pois aquele Brasil saiu de cena, expulso pela Coalizão da Maldade que tomou o Planalto a partir da FIESP e cá estamos, back to 1964. Dureza, tristeza e eu, como disse, perdi a graça.
Aqui na minha estimada SP, Haddad, o melhor governante em ação no Brasil e o único que anda operando de acordo com as premissas do século 21, não foi para o segundo turno. O século 18 nos aguarda na figura assustadora do liberalismo damedos do Dória. Marta, que foi uma ótima prefeita,  se alinhou com o pior do Brasil sem ganhar nada com isso, apenas destruiu um currículo ao votar pelo golpe. Isso, a gente nunca vai esquecer.
E Porto Alegre, caros sulvinteumenses, assusta. Que vocação pelo nada, minha gente! Que  prazer em destruir qualquer chance de um futuro, de um presente minimamente funcional! Daqui eu olho e pasmo. Enquanto eram Luciana e Raul na frente, a cidade parecia ter recuperado o seu mojo. Logo, logo a cidade iria se dar conta de que PSOL é apenas uma sigla, não uma alternativa pra um Executivo moderno, e teríamos de novo uma prefeitura, um prefeito, um sentido.
Aí, caros leitores, olho pras pesquisas e, cabunga! Sebastião Melo e Marchezan? Seriously? PMDB e PSDB? A cidade andou fumando aquelas coisas coletivamente? Não basta o Sartori? Ninguém aprendeu coisa alguma? Mas, mas, mas, mas.
O resto até que faz sentido.  Marchezan representa aquele fiel eleitorado do antigo Correio do Povo, que adora um direitão clássico. PSOL não deixa de ter seu charme de brique de final de semana e orgânicos. PT é o que houve de melhor na cidade, nos tempos de Forum Social Mundial, quando a gente teve a impressão de que íamos largar o acampamento do vinte de setembro e partir pro mundo. Agora, Sebastião Melo? Mais Fogaça, mais Fortunati, mais nada, em uma cidade dizimada pela afazia, é demais, minha gente, demais demenos.
Onde esse povo está com a cabeça? Não, não respondam, porque a resposta é óbvia.
Meu voto, dessa vez, foi definidor. Foi por Porto Alegre, por uma cidade que merece muito mais do que tem recebido e dado a si mesma. Eu gostaria que meu voto fizesse o Sartori acordar em 1925, onde ele se deve se sentir mais à vontade. Gostaria que ele apagasse o pior do governo Furtunati e aquelas horrendas caixas de lixo espalhadas pela cidade. Gostaria de reverter o tempo e apagar o que tornou Porto Alegre a cidade onde meus amigos se sentem inseguros o tempo inteiro e as gangues fazem a festa. Gostaria de fazer a cidade de novo gostar do melhor, e não do pior em si mesma. Gostaria de fazer Porto Alegre se tornar um lugar vibrante e ousado, como SP tem sido. Gostaria de baixar a velocidade das ruas para os 50 km por hora que salvam tantas vidas por aqui. Gostaria de ver a cidade se repensando para andar de bicicleta por toda parte, e ter coragem de fazer um bom plano para a sua beira  de rio, de estimular start ups, de virar uma cidade centrada na economia cultural e tecnológica, que ela tão facilmente poderia ser. Gostaria de ter trem para a Restinga, e não mais submeter os trabalhadores a horas em ônibus tão desconfortáveis e sem ar condicionado em uma cidade amazônica como a nossa. Gostaria de usar muito melhor o rio como transporte, como lazer, como área de vida. Reformar o centro para ele aproveitar a vista espetacular que ignora, refazer a Feira do Livro, desfazer o nó que virou o trânsito – muito pior do que aqui, acreditem.
Gostaria tanto.
E bom ver vocês de novo, depois dessa longa ausência. Vocês devem ter sentido muito a minha falta, enquanto a Venezuela ia se tornando o que eu tinha avisado que ela se tornaria aqui nessas páginas, e enquanto o Brasil virou essa coisa que mais do que tudo entristece.
A luta continua, e é pra isso que a gente serve. Um abraço a todos, e vamos em frente.
.oOo.
*Marcelo Carneiro da Cunha é escritor.
**Via http://www.sul21.com.br/

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