*Por Ribeiro Filho
Sobre a postagem "E agora, STF?!", em relação a Teoria do Domínio do Fato aplicado pelo STF na AP 470 e contestado por Roxin, penso o seguinte:
Desde que iniciei meus estudos na ciência do Direito, em 1999, passando por estágios com juízes e advogados, até minha formação como advogado, percebo modestamente três fatores indeléveis que acabaram por culminar no histórico (e irregular) julgamento do mensalão:
(1º) As diversas atribuições ao Ministério Público concedidas na CF/88 - na intenção veloz e ingênua da A. N. Constituinte em dissipar qualquer resíduo do regime da ditadura militar - que estão se transformando em deturpações de poder, ou de atribuições. Ora, o MP detém a (correta) fiscalização da lei e a titularidade da ação penal pública e condicionada a representação, sendo a olho nu um órgão acusatório, com o "cacoete da acusação" (assim como o "cacoete da defesa" que nós temos), sem hipocrisia. Agora "querem" também investigar! Cuidado, magistrados: daqui a pouco decerto queiram também julgar.
(2º) A supressão velada (cada vez menos velada e mais descarada) da advocacia (portanto da defesa) e o desrespeito aos advogados pelos legisladores brasileiros, por diversos servidores da Justiça e pela imprensa, que subliminarmente parecem taxar o advogado perante a opinião púbica como "inimigo da justiça", o que é argumento vil e totalmente oposto ao papel constitucional da advocacia no Ministério Privado.
(3º) A pressão desmedida da imprensa (sobretudo nacional e estadual) em casos jurídicos e políticos, muitas vezes não em virtude do papel lídimo da imprensa (que é informar), mas sim com segundas intenções - na maioria das vezes econômicas, pois "se o circo não pega fogo hoje, o jornal não sai da prateleira amanhã".
Junte-se os três fatores e temos verdadeiros e potencializados julgamentos sumários, onde o acusador tem sempre razão e é tratado pela imprensa como justiceiro e, em contrapartida, a defesa é ridicularizada, tratada como bandida, corruptível e não raras vezes é sutilmente colocada como "sub-partícipe" da própria infração e/ou do infrator. É uma assustadora inversão de valores e o destronamento gradativo do Direito de Defesa.
Diga-se, com propriedade, que sou defensor ferrenho da imprensa e do "jus informandi", além da liberdade de expressão, crítica e pensamento. No entanto, sou contra o uso da informação midiática com as segundas intenções comentadas acima; que fique claro.
Ainda em contrapartida, gize-se que sou um eterno otimista. Ainda tenho esperança que não chegaremos a tamanho caos jurídico e social - que seria O Fim -, e que retornaremos a égide do verdadeiro Estado Democrático de Direito, tudo sem antes muita luta.
Se bem que o julgamento do mensalão é, sem dúvidas, um dos maiores exemplos do "Princípio do Fim", e olha que não sou um "Lulista" muito menos filiado ou simpatizante do Partido dos Trabalhadores. É. Estou politicamente "fora de moda", reconheço. (risos).
Sobre o caso, não posso deixar de comentar o maior erro crasso: o PGR Roberto Gurgel ter deixado de fora do rol dos denunciados o ex-presidente Lula, alegando "falta de provas" ainda no inquérito policial. Ué, mas se não havia provas de que o próprio presidente à época sabia do esquema - repita-se, mesmo sendo o presidente! - como posso acreditar que havia provas para condenar os réus que foram condenados pelo STF? Logicamente comento sem conhecer os autos da AP 470, mas sim por haver lido a denúncia e as alegações finais (um "salve" para a internet e a tecnologia...) além de assistir os julgamentos, quando tenho um tempinho, na TV Justiça.
Joaquim Barbosa já é tratado como herói pela imprensa - e da imprensa por grande filão da sociedade brasileira. Sim, o mesmo ministro que no começo das sustentações orais pela Defesa apresentou aos pares proposta de envio a OAB de representação contra os advogados que requereram que ele fosse declarado impedido de votar no processo, alegando, o ministro, que os pedidos dos três advogados "beiravam a má-fé". Ali se desenhava como seria o julgamento em relação aos advogados e consequentemente ao Direito de Defesa.
Ora, mas má-fé não seria o pedido midiático do PGR, em sua denúncia de looooonga exposição no tempo - ao contrário do tempo exato de 1h concedido aos advogados-, ao requerer fanfarroneamente a "prisão imediata" dos condenados após a sentença?
Má-fé não seria a exposição dos próprios pares, no comentário do min. Barbosa dirigido ao min. Lewandowski, de que parecia que ele estava "atuando pela defesa"?
E mais, muito mais.
Pois Lewandowski, o ministro "apupado" por Barbosa e pela imprensa, foi quem proferiu a frase cerne do contido na postagem "E agora, STF?", ao categoricamente, lá pelas tantas, afirmar: "a teoria do domínio do fato, nem mesmo se chamássemos Roxin, poderia ser aplicada". Pois o achincalhado ministro está na iminência de dar a volta por cima, por mais que em tempo algum qualquer dos outros ministros que votaram acompanhando o relator por esta Teoria, irão reconhecer o erro.
Ricardo Lewandowski, o carioca nascido em 48, foi a voz e a vez do "juridicamente correto" no irregular julgamento da AP 470. Que fique o registro para a história.
Juristas como ele é que me levam a acreditar no que relatei neste comentário e a lutar contra as "covardias" e defender o que considero correto.
Aliás, todos os operadores do Direito e os que, mesmo não sendo, acreditam que em um Estado Democrático de Direito o papel do estado-juiz é julgar, observando a defesa e o contraditório, e que condenar e absolver é apenas consequência, devem se manifestar com altivez, a fim de que o nosso País não vire simplesmente o caos. Ou o velho Brasil do DOPS.
*José Amélio Ucha Ribeiro Filho (foto) é Advogado - Santiago/RS.
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