A
mesada e o mensalão
Por JANIO DE FREITAS*
Passados
sete anos, ainda não se sabe quanto houve de mentira na denúncia inicial de
Roberto Jefferson (foto).
A
mentira foi a geradora de todas as verdades, meias verdades, indícios
desprezados e indícios manipulados que deram a dimensão do escândalo e o espírito
do julgamento do "mensalão".
Por
ora, o paradoxo irônico está soterrado no clima odiento que, das manifestações
antidemocráticas de jornalistas e leitores às agressões verbais no Supremo,
restringe a busca de elucidação de todo o episódio. Pode ser que mais tarde
contribua para compreenderem o nosso tempo de brasileiros.
Estava
lá, na primeira página de celebração das condenações de José Dirceu e José
Genoino, a reprodução da primeira página da Folha em 6 de junho de 2005.
Primeiro passo para a recente manchete editorializada -CULPADOS-, a estonteante
denúncia colhida pela jornalista Renata Lo Prete: "PT dava mesada de R$ 30
mil a parlamentares, diz Jefferson". O leitor não tinha ideia de que
Jefferson era esse.
Era
mentira a mesada de R$ 30 mil. Nem indício apareceu desse pagamento de montante
regular e mensal, apesar da minúcia com que as investigações o procuraram.
Passados sete anos, ainda não se sabe quanto houve de mentira, além da
mensalidade, na denúncia inicial de Roberto Jefferson. A tão citada conversa
com Lula a respeito de mesada é um exemplo da ficção continuada.
A
mentira central deu origem ao nome -mensalão- que não se adapta à trama hoje
conhecida. Torna-se, por isso, ele também uma mentira. E, como apropriado, o
deputado Miro Teixeira diz ser mentira a sua autoria do batismo, cujo jeito
lembra mesmo o do próprio Jefferson.
Nada
leva, porém, à velha ideia de alguém que atirou no que viu e acertou no que não
viu. A mentira da denúncia de Roberto Jefferson era de quem sabia haver
dinheiro, mas dinheiro grosso: ele o recebera. E não há sinal de que o tenha
repassado ao PTB, em nome do qual colheu mais de R$ 4 milhões e, admitiria mais
tarde, esperava ainda R$ 15 milhões. A mentira de modestos R$ 30 mil era
prudente e útil.
Prudente
por acobertar, eventualmente até para companheiros petebistas, a correnteza dos
milhões que também o inundava. E útil por bastar para a vingança ou chantagem
pela falta dos R$ 15 milhões, paralela à demissão de gente sua por corrupção no
Correio. Como diria mais tarde, Jefferson supôs que o flagrante de corrupção,
exibido nas TVs, fosse coisa de José Dirceu para atingi-lo. O que soa como
outra mentira, porque presidia o PTB e o governo não hostilizaria um partido
necessário à sua base na Câmara.
Da
mentira vieram as verdades, as meias verdades e nem isso. Mas a condenação de
Roberto Jefferson, por corrupção passiva, ainda não é a verdade que aparenta.
Nem é provável que venha a sê-lo.
MAIS
DEDUÇÃO
Em
sua mais recente dedução para voto condenatório, o presidente do Supremo, Ayres
Britto, deu como certo que as ações em julgamento visaram a "continuísmo
governamental.
Golpe,
portanto, nesse conteúdo da democracia que é o republicanismo, que postula
renovação dos quadros de dirigentes".
Desde
sua criação e no mundo todo, alcançar o poder, e, se alcançado, nele permanecer
o máximo possível, é a razão de ser dos partidos políticos. Os que não se
organizem por tal razão, são contrafações, fraudes admitidas, não são partidos
políticos.
Sergio
Motta, que esteve politicamente para Fernando Henrique como José Dirceu para
Lula, informou ao país que o projeto do PSDB era continuar no poder por 20
anos.
Não
há por que supor que, nesse caso, o ministro Ayres Britto tenha deduzido haver
golpe ou plano golpista. Nem mesmo depois que o projeto se iniciou com a compra
de deputados para aprovar a reeleição.
*Jornalista da Folha de São Paulo, fonte desta postagem.
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