*Ricardo Melo escreve:
Aconteceu em 3 de janeiro,
no Recife, o enterro de mais uma suposta tentativa de criar algo novo na
política brasileira. Com pompa e circunstância adequadas, a data marcou o
embarque dos tucanos do PSDB no governo de Eduardo Campos, do PSB. O discurso
do anfitrião mais parecia um obituário envergonhado.
"Aprendi com meu avô, o
ex-governador Miguel Arraes, o valor das alianças políticas. Mas não alianças
feitas para interesse de políticos ou de partidos. Temos sempre de saber fazer
alianças colocando os interesses do povo no centro do que está sendo feito.
Esta é a distinção entre a velha e a nova política", comemorou o
governador, no melhor estilo me engana que eu gosto.
Todos sabemos a que
"povo" interessa a cerimônia realizada no Centro de Convenções, sede
provisória do governo estadual. Pergunte a algum cidadão comum pernambucano que
grande diferença fará a entrada de um tucano na secretaria estadual do Trabalho
e na presidência do Detran local ""cargos assumidos pelo PSDB.
A resposta é óbvia. Ou
alguém sinceramente acha que o emprego no Estado vai disparar ou ao menos a
carteira de habilitação local sairá mais rápido com tais mudanças? A própria
(pouca) importância dos postos aceitos pelo PSDB escancara o sentido da
barganha. O fato é que a cerimônia serviu para mostrar que, entre a velha e a
nova política, o governador cravou sua opção: escolheu a velha, levando junto a
ex-ministra Marina Silva.
Que fique claro: ninguém
pode contestar o direito de Campos aliar-se com quem quiser. Se há alguma coisa
em que o Brasil é insuperável é na, vamos dizer, elasticidade das composições
partidárias. Do governo federal às administrações locais, é possível encontrar
misturas que desafiam tanto a coerência de programas quanto os limites da
análise combinatória. Alianças sempre, evidentemente, "em nome do
interesse do povo".
O que se discute mais uma
vez é a propaganda enganosa. Pouco tempo atrás, Campos e Marina firmaram um
acordo para o ingresso da ex-ministra no PSB. No evento, anunciado como a
aurora de um novo modo de fazer política, as duas figuras discorreram sobre a importância
daquele momento. Lideranças da Rede usaram e abusaram do repertório sonhático
para dourar o enlace.
Mas na prática a teoria é
sempre outra. Como se viu, nem foi preciso muito tempo para sentir o cheiro de
mofo na própria casa do anfitrião. Em mais um rasgo de sinceridade, a deputada
Luiza Erundina, do PSB de Campos e Marina, foi direto ao ponto. "A lógica
eleitoral se superpõe a tudo. Somos vítimas desta lógica", disse em
entrevista publicada na Folha de ontem.
E a lógica eleitoral do
momento, para Campos e cia., é impedir a reeleição de Dilma e ponto final. Nada
de errado nisso: faz parte do jogo e é seu direito. Pede-se apenas ao pessoal
que chame as coisas pelo nome, sem tentar vender como novidade as práticas mais
gastas e requentadas da política brasileira.
Nenhum comentário:
Postar um comentário